Quando Bill Sienkiewicz surgiu comercialmente para o mundo dos quadrinhos, nos anos 80, a indústria se dividiu, entre aqueles que o entenderam e os que queriam muito, mas que por algum motivo não conseguiam.
O traço sem pretensão, a narrativa dinâmica e a composição de pontos míopes, distorcidos, irreais, corajosos e com explosões dramáticas que permeavam quadro a quadro de obras como Elektra: Assassina, a entrega do artista era tamanha, que tornava impossível aceitar que todo o esforço de sobrepor o papel fosse mero espetáculo impresso em papel Couché em uma indústria milionária e até então pueril.
Com um tiro direto a nossa realidade, escravizada por modas passageiras e traços copiosos, que carece de personalidade e perspectiva, muitas vezes curvando-se as imposições de um mercado muito distante e nada preocupado com os apaixonados e zelosos fanboys, cosplayers, “ticolinos e ticolinas” que sacrificam horas, de um precioso tempo na terra a discutir se a genitália do Coisa é ou não de pedra, embarcando em toda sorte de vaidades e em páginas com tantos efeitos de photoshop, que não é possível perceber onde termina o homem e começa o software.
Encontramos artistas com disposição a estampar realidade no peito da meninada, chamando atenção a condição mais primitiva do ser - humano e suas necessidades básicas em uma sociedade sem alicerces, somente desalinhos. Encontramos no fundo do nanquim o trampo de Marcelo d´Salete, quadros soltos, ora traço, ora respingos, ora rachuras, ora instrumento musical, tocando o tal trompete, impondo quadros soltos, brincando com tempo e o espaço, contando histórias. O que me leva ao mestre Sienkiewicz, pela agudeza com que a arte é imposta ao olhar do observador que menos atento deixa de perceber como tudo é amarrado em uma trama que brinca realçando o caótico que se explica em ângulos meticulosos e na dureza dos diálogos.
Sem o chavão rococó do discurso social, NoiteLuz trafega pela miséria humana, explicando o quão vitimados somos, dentro da realidade de concreto, metal, lixo e amargura da metrópole. Passeia por nossa solidão e subserviência. Ocupando os cantos, vidas vivendo na beirada. Qualquer país, qualquer Estado, qualquer Guaianazes, Capão, Brasilândia, Cidade Tiradentes, Itaim Paulista, a qualquer hora. São vidas escondidas dentro de nós que despertam na irregularidade da própria vida. NoiteLuz é para ser devorado com cautela e reservar a lágrima revoltada com aquele velho aperto no peito para o final de forma simples. Ou, para os quadrinhos, em um tempo em que ainda existiam mestres.
Imagens:
# 1 - Bill Sienkiewicz.
# 2 - página da Graphic Elektra: Assassina.
# 3 - Capa da revista FRONT por d´Salete.
# 4 - Capa do livro NoiteLuz por d´Salete.
Roberto Gobatto
3 comentários:
Estou ansioso para o lançamento, essa prévia foi de encher os olhos.
Que lindo esse texto! De fato, dá vontade de ir correndo à livraria comprar NoiteLuz... Desculpe, não sei se perdi alguma coisa, mas quando vai ser o lançamento?...
VIA LETTERA RESPONDE: Nosso caminho de volta pra casa esta repleto de luzes, cores e pessoas que apostam no UPDATE Via Lettera. Isso é ótimo. Para o Mateus e para a Luiza muito obrigado pelos comentários. O lançamento foi dia 09/09, terça passada, e foi incrível. Em breve as fotos vão pro ar.
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